Tradição apostólica e Magistério da Igreja

Tradição apostólica e Magistério da Igreja

Por Ir.Pe. Lauro do Coração Eucarístico de Jesus, N J*

Mt 16,13-20; Jo 21,15-17

É interessante notar que nossos irmãos separados continuamente nos acusam de infidelidade ao ensino da Sagrada Escritura, muitas vezes quando se referem ao culto prestado à Ss. Virgem. Boa parte do que nós católicos acreditamos a respeito de Nossa Senhora, realmente não está diretamente, ou melhor, explicitamente mencionado na Bíblia. Então, por qual motivo professamos a fé na Imaculada Conceição e Assunção de Maria, por exemplo?

Para responder corretamente a estas perguntas e não nos deixar enganar, é mister ter em mente, de maneira bem clara, a noção do que seja “Tradição Apostólica” e “Magistério da Igreja”.  Pois, boa parte dos dogmas marianos dão a impressão em um primeiro momento, que estão mais intimamente ligados a Tradição Apostólica e ao Magistério da Igreja do que a Escritura. Faz-se necessário também conhecer e entender um pouco da história, nomeadamente os tempos da Reforma Protestante e Contra-Reforma. No século XVI o monge agostiniano Martinho Lutero rompeu com o ensino plurissecular da Igreja acerca dos dois itens citados, portanto com boa parte do que a Igreja Católica já ensinava há quinze séculos passados.  Sua doutrina (“Sola Scriptura”) ensina que só a Bíblia pode ser considerada como fonte de revelação e todo fiel tem direito de interpretar a Bíblia como melhor lhe parecer,mesmo em matéria de doutrina. Certamente que é por este motivo que a Igreja Protestante, hoje em dia está esfacelada, até onde se pode contar, em mais de 200.000 denominações! Não há entre nossos irmãos separados uma autoridade magisterial (alguém com a função e autoridade para ensinar a doutrina: Atos 13,1; I Cor 12,28), cada um é mestre de si mesmo ao interpretar a Escritura, logicamente que isto gera confusão. Por exemplo, existe um discatério na Igreja Católica responsável pelo correto uso da fé na Igreja, é a “Sagrada Congregação Para a Doutrina da Fé”. Ela é presidida por um cardeal, que em nome do S.Padre, averigua as irregularidades referentes ao ensino da fé. Podendo emitir parecer e até punições, sempre em nome do Papa. Um caso bem próximo de nós é o do ex Frade Franciscano Leonardo Boff, depois da condenação ao “Silêncio Obsequioso” terminou por perder a cátedra de mestre católico, ou seja, o poder de ensinar teologia em nome da Igreja Católica[1], como dissemos acima, tudo isto porque se acredita que existe um poder de magistério por parte da autoridade da Igreja.

O atual Papa, Bento XVI, exerceu este cargo durante muitos anos em estreita colaboração com o pontificado do seu antecessor, o beato João Paulo II.

Mas o que é mesmo “Tradição Apostólica” ou “Magistério Eclesial”? O que diz a primeira e quem pode exercer a segunda?

“Tradição Apostólica” é todo o conteúdo de fé que veio até nós e que remonta aos Apóstolos, ou ainda, que o Espírito Santo ensinou à Igreja nascente, por meio dos Apóstolos e dos “Padres da Igreja” (Aqueles primeiros Teólogos da Igreja, por isso são chamados de “Pais”), porque todo o ensino fundamental da Igreja se reporta à época dos Apóstolos. Estes ensinos nunca foram codificados em um livro, como a Bíblia, porém a Igreja atesta a genuína Inspiração destes ensinamentos. Esta Tradição, embora distinta da Bíblia, está em intima união com a Escritura, são duas formas de conhecer o plano de Deus, essas duas formas tem uma fonte apenas, como é óbvio: a Revelação que Deus faz de si mesmo, seja via oral ou escrita.

Na verdade, a Palavra de Deus é única, mas se manifesta em duas formas, ao mesmo tempo distintas e unidas entre si, porque uma não anula a outra, ao contrário, se completam. É importante notar que a Bíblia antes de ser como a temos agora, passou pela experiência de ser tradição oral. Portanto, quem pretende ficar somente com a Bíblia como fonte de Revelação Divina sem levar em conta a possibilidade de uma tradição oral anterior, está completamente equivocado, pois sem tradição oral, levando seriamente em conta o seu processo de composição, nem a Bíblia existiria.

A palavra magistério vem do latim “magister”, e quer dizer “mestre” (aquele que ensina, professor). A Igreja acredita que quando o Senhor Jesus confiou as chaves da Igreja a S. Pedro confiou-lhe juntamente, como é natural, a tarefa de confirmar a fé dos irmãos (da Igreja) Mt 16,13-20;Jo21,15-17. Assim é que, quem tem a tarefa de ensinar a fé na Igreja, em primeiro lugar é o S.Padre, depois todos os bispos, desde que estejam em comunhão com o Papa. Durante um concílio o Papa pode até nem estar presente, como aconteceu com alguns, porém quem confirma e tornam válidas as decisões é o Papa, pessoalmente ou por meio de um delegado, investido de plenos poderes. Em cada Diocese, o primeiro guardião da integridade da doutrina da fé é o Bispo Diocesano em plena comunhão com a Sé de S.Pedro. Somente em caso de separação da Sé diocesana da Sé de Pedro por parte de um Bispo, é que um fiel católico pode e deve eximir-se da obediência ao seu pastor.

Observemos ainda que a “Sagrada Tradição”, a “Sagrada Escritura” e o “Magistério da Igreja” são meios ordinários deixados por Deus-Pai à Esposa de seu Filho, a Igreja, para que animada pelo Hálito da vida (o Espírito Santo) complete a obra de salvação do gênero humano até a consumação dos séculos

Vejamos o que nos diz o catecismo da Igreja Católica:

85        “O ofício de interpretar autenticamente a Palavra de Deus escrita ou transmitida foi confiado unicamente ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade se exerce em nome de Jesus Cristo”, isto é, foi confiado aos bispos em comunhão com o sucessor de Pedro, o bispo de Roma.

86        “Todavia, tal Magistério não está acima da Palavra de Deus, mas a serviço dela, não ensinando senão o que foi transmitido, no sentido de que, por mandato divino, com a assistência do Espírito Santo, piamente ausculta aquela palavra, santamente a guarda e fielmente a expõe, e deste único depósito de fé tira o que nos propõe para ser crido como divinamente revelado.”

87        Os fiéis, lembrando-se da palavra de Cristo a seus apóstolos: “Quem vos ouve a mim ouve” (Lc 10,16), recebem com docilidade os ensinamentos e as diretrizes que seus Pastores lhes dão sob diferentes formas.

95        “Fica, portanto, claro que segundo o sapientíssimo plano divino, a Sagrada Tradição, a Sagrada Escritura e o Magistério da Igreja estão de tal modo entrelaçados e unidos que um não tem consistência sem os outros, e que juntos, cada qual a seu modo, sob a ação do mesmo Espírito Santo, contribuem eficazmente para a salvação das almas.”

Para um maior aprofundamento do tema recomendamos ainda, um estudo dos seguintes outros números do Catecismo da Igreja Católica:

81,84,971124,75,76,77,78,79,2651,80,81,82,83,96,113,120,126,174,888,889,890,891,892,2035,2033,2034,2032,2036,121,123,106,138,124,127,2763,136,139,122,131,132,107,103.

Conhecendo bem qual o papel da Tradição e do Magistério, juntamente com o estudo da Escritura, compreenderemos melhor o lugar reservado a pessoa de Maria na história da salvação.


[1] Diga-se de passagem, que isso não é excomunhão. A propósito, Leonardo Boff nunca foi excomungado porque seus ensinos, à época,não tocavam a essência da fé católica,era mais uma questão disciplinar ou advertências para não cair em erro pior.Hoje a situação mudou porque mudaram os posicionamentos e a meu ver,seus erros agora parecem tocar pontos essenciais da fé não só católica,mas até cristã como um  todo.

* Padre religioso do Instituto Religioso Nova Jerusalém graduado em Filosofia e Teologia pelo FCF. Atualmente está se especializando em Estudos Bíblicos nesta faculdade.

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