BÍBLIA E JUVENTUDE: o perfil do jovem bíblico no Antigo Testamento

BÍBLIA E JUVENTUDE: o perfil do jovem bíblico no  Antigo Testamento

A palavra e o chamado de Deus são para todos, e sabemos que o jovem de hoje, não diferente dos de outros tempos, tem sede de uma experiência de Deus, de se encontrar verdadeiramente com o sagrado e consigo mesmo. Pensando nisso, gostaria de citar alguns exemplos bíblicos de jovens convocados que corresponderam ao apelo divino, estando atentos às necessidades de seu tempo e que podem nortear também nos dias de hoje nossa juventude “pós moderna”, já que a Palavra de Deus é sempre atual.

Poderíamos perguntar que lugar ocupa o jovem no contexto bíblico, seu perfil, as referências e sua relação com Deus e sua comunidade. Para surpresa de alguns, em toda Escritura, o jovem tem assumido um papel importante na história da salvação. O protagonismo juvenil na Bíblia é um tema tão presente que já no quarto capítulo do livro do Gênesis, podemos notar a preferência de Deus para com Abel, o filho mais moço do primeiro casal bíblico: “Ora, Deus agradou-se de Abel e de sua oferenda. Mas não se agradou de Caim e de sua oferenda” (vv. 4 e 5). Interessante também o que traz a nota de rodapé da Bíblia de Jerusalém que comenta esses versículos:

“Primeira aparição do tema do mais novo preferido ao mais velho, pelo qual se manifesta a livre escolha de Deus, seu desprezo pelas grandezas terrenas e sua predileção pelos humildes; esse tema volta frequentemente ao longo do Gênesis (Isaac preferido a Ismael, cap. 21; Jacó a Esaú, 25,23;27; Raquel a Lia, 29,15-30; igualmente os filhos destas…) e em toda a Bíblia (I Sm 16,12 – caso de Davi; I Rs 2,15 – caso de Salomão etc.)”. [p. 39, comentário D]

Sabemos que na Bíblia, com o direito de primogenitura, o filho mais velho de uma família gozava de certas regalias, pois um filho representaria a garantia da posteridade, a bênção de Deus na família: “Deus falou a Moisés, dizendo: “Consagrai todo primogênito, todo o que abre o útero materno, entre os israelitas. Homem ou animal, será meu” (Ex 13,1s). No caso de uma descendência real, este herdaria o trono (1Rs 2,15). Mas como vimos, é comum notarmos a predileção divina pelos mais jovens, não obstante essa lei. Preferindo Deus os mais humildes e frágeis, está mostrando sua liberdade, Deus quis assim e pronto. A Bíblia não está interessada em mostrar o porquê, mas simplesmente expõe a ação de Deus que vai se desenrolando ao longo da história. Por questões legais, a figura do mais velho pode se destacar, mas pela afeição divina, há uma atenção especial pelos pequenos e mais jovens.

No capítulo 24 do Gênesis nos deparamos com Rebeca, da linhagem de Abraão, e que mais tarde deixará tudo para casar com o filho mais novo, Isaac. “A jovem era bela; era virgem”, distinguida por sua disposição e generosidade (vv. 18.19.25). A fé, no sentido bíblico, nunca foi reduzida apenas por “dar credibilidade” a algo, mas como a própria palavra latina para fé (fides), sugere “fidelidade”, ou seja, a fé é também um seguimento, exige-se um deslocamento, como fez Abraão. Assim também fez Rebeca, juntamente com Abraão e sua nova família, deixaram tudo em obediência à palavra de Deus.

Um dos textos clássicos do “Antigo Testamento” com relação ao tema é o caso do jovem José, filho de Jacó, conhecido na Bíblia pela sua capacidade de ter sonhos proféticos e discernir os demais. Sua história compreende quatorze capítulos, formando a última parte do Gênesis (37 – 50). Com seus dezessete anos já era pastor de ovelhas. Interessante em sua história é que os fatos vão se desenrolando sem intervenção visível de Deus, ou seja, sem “revelação”, o que mais nos parece um ensinamento. Na história de José, podemos notar que era o filho mais amado de seu pai. O texto explica que, o fato de seu pai o querer tanto bem, explica-se por ele ser o fruto de sua velhice, mostrando assim, ser alvo da bondade de Deus para com sua família. Por causa disso, foi odiado por seus irmãos, que mais tarde lhe venderiam como escravo aos madianitas. Depois disso é levado ao Egito, onde conquista o respeito do Faraó por sua sabedoria e é então elevado a administrador dali.

No primeiro livro de Samuel, encontramos dois grandes casos: a vocação dos jovens Samuel e Davi. Embora todo o terceiro capítulo se dedique a Samuel, é interessante notar os detalhes de 2,18.21: “Samuel estava a serviço da face de Deus. (…) E o jovem Samuel crescia com o Senhor”. Samuel (no hebraico, Shemw’El) significa “pedido a Deus”, pois sua mãe Ana era considerada estéril (1,5) e vivia sendo humilhada pela outra mulher do marido Elcana, habitantes da montanha de Efraim. Após uma oração fervorosa e suplicante de Ana (1,9-18), Deus a concede esse filho, que depois lhe será consagrado para o serviço do Templo e serviria a Deus na presença do sacerdote Eli. Muito interessante o relato do terceiro capítulo, pois o texto inicia expressando o contexto histórico da fé de seu povo na época, ou seja, como a palavra (revelação) de Deus era rara naqueles dias, até mesmo por visões; isso se dava pelo distanciamento do povo para com Deus. A revelação divina se dá a Samuel não por sonho, mas por uma voz que o desperta de seu sono. Samuel ainda não “conhecia” a Deus nessa dimensão mais íntima, por isso, confunde sua voz com a do Sacerdote Eli, indo ao seu encontro por três vezes. Percebendo Eli que Deus se comunicava com Samuel, o instrui dizendo: “Vai deitar-te e, se te chamar de novo, dirás: ‘Fala, Senhor, pois o teu servo ouve'” (v. 9). E assim o fez. Notamos a prontidão e obediência de Samuel pelas palavras-chaves repetidas: “eis-me aqui!” (vv. 4, 5 e 16), “aqui estou!” (vv. 6 e 8) e “fala, pois teu servo ouve!” (v. 10). Desde então, todo Israel saberia que o menino estava confirmado como profeta, ou seja, porta-voz e amigo de Deus (v. 20).

Outra passagem que traz mais claro esse tema no Antigo Testamento é o relato da vocação de Davi, humilde pastor, natural de Belém e filho mais novo de Jessé, de uma prole de oito filhos (1Sm 16,1-13). Deus disse ao profeta Samuel, aquele que mais tarde o consagraria como o segundo rei de Israel: “… Tu ungirás para mim aquele que eu te disser” (v.3). O rei que o Senhor queria estava entre os filhos de Jessé. Quando Samuel, juntamente com outros sacerdotes, chegam à casa do pai de Jessé, vê primeiramente Eliab, um de seus filhos, e Samuel fica impressionado com o porte do garoto, porém, Deus o adverte: “Não te impressione a sua aparência nem a sua elevada estatura: eu o rejeitei. Não se trata daquilo que vêem os olhos, pois eles vêem apenas com os olhos, mas o Senhor olha o coração” (v. 7). Jessé fez passar diante de Samuel seus sete filhos, porém, Deus confirmava no coração de Samuel que nenhum daqueles queria para o reinado. Enquanto isso, Davi apascentava ovelhas. Segundo as descrições do versículo 12, ele era ruivo, de belo semblante e de admirável presença. A partir desse momento e depois, o Espírito do Senhor precipitou-se sobre Davi. Esse mesmo espírito é citado em Isaías, no capítulo 11, onde encontramos a lista dos sete dons, fazendo uma alusão à casa de Davi. Esse jovem é muito conhecido em virtude de sua prudência e bravura.

 

Salomão, filho de Davi, célebre por sua sabedoria e inteligência na história bíblica, era genro do Faraó, rei do Egito. Segundo o trecho de 1Rs 3,3, amou ao Senhor, comportava-se segundo os preceitos do pai. Embora nos apareça uma advertência afirmando que Salomão oferecia sacrifícios e incensos nos “lugares altos”, coisa inconcebível para um judeu, nada nos tira o exemplo de coragem e perseverança daquele que agradou ao Senhor pelo seu pedido (3,10). Deus o interpela em sonho: “Porque foi este o teu pedido, e já que não pediste para ti vida longa, nem riqueza, nem a vida dos teus inimigos, mas pediste para ti discernimento para julgamento, vou fazer como pediste: dou-te um coração sábio e inteligente, como ninguém teve antes de ti e ninguém terá depois de ti” (vv. 10 – 13). Interessante que, se prosseguirmos com a leitura, veremos que Deus o concede também bens que não o pedira.

Difícil nunca ter ouvido falar do episódio de Daniel e seus três companheiros: Ananias, Misael e Azarias (apelidados pelos babilônios de (Sidrac, Misac e Abdênago). Primeiramente foram convocados por Asfenez, chefe dos eunucos, por ordem de Nabucodonosor, Rei da Babilônia, a trabalharem em sua côrte justamente por serem considerados “sem defeitos, de boa aparência, instruídos em toda a sabedoria, conhecedores da ciência e sutis no entendimento, tendo também vigor físico necessário para servirem no palácio do rei” (Dn 1,4). Mas na verdade, são mais conhecidos pela ousadia de não compactuar com o culto pagão de Nabucodonosor, que impôs uma lei de adoração a uma estátua de ouro. Preferindo obedecerem a Lei de Deus, se recusaram a prostrar-se diante da imagem pagã, e por castigo, foram postos em uma fornalha de fogo ardente, porém, Deus intervém através da figura de um Anjo, salvando-os das chamas. O temor do Senhor faz com que entreguemos nossa própria vida para sermos agradáveis a Ele.

Poderíamos citar outros exemplos, mas precisaríamos de várias páginas. Nada como ler a Bíblia integralmente, de ponta-a-ponta para fazermos uma inesquecível viagem!

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